Fim dos lixões estimula o mercado de resíduos

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Mudança incentiva negócios focados no tratamento e geração de energia a partir de detritos. Setor movimentou R$ 23 bilhões em 2012

Embora longe de ser cumprida, a meta de fechar todos os lixões do país até agosto deste ano – estabelecida pela Política Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010 – tem impulsionado investimentos nas áreas de coleta, tratamento e reciclagem. Nos últimos cinco anos, a movimentação financeira das companhias que integram a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) cresceu a uma taxa média de 10% ao ano.

Em 2012, os serviços de coleta pública e privada de resíduos, destinação de lixo a aterros sanitários e reciclagem movimentaram R$ 23 bilhões no país, pelos cálculos da Abrelpe. "Para 2013, uma expansão de 10% seria factível, mas ainda não temos este percentual fechado", informa o diretor-presidente e CEO da associação, Carlos Silva Filho. 

No período de dez anos terminado em 2012, a população brasileira aumentou 9,75%, enquanto a geração de resíduos domiciliares se expandiu em 21%, segundo dados do levantamento "Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil", da Abrelpe. O estudo indica que, em 2012, 60% do lixo domiciliar recebia destinação adequada e 40% eram descartados de maneira inadequada. Dez anos antes, 60% do volume de resíduos tinham destinação inapropriada. 

Em nível global, houve aceleração dos investimentos nos últimos anos. Divulgada em dezembro, a projeção mais recente da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA, na sigla em inglês) era de que os investimentos no segmento totalizassem US$ 20,9 bilhões em 2013. O montante é mais do dobro registrado no ano anterior, quando foram investidos US$ 10,2 bilhões. Para 2014, há US$ 11,9 bilhões confirmados, mas o total final de investimentos deve chegar à casa de US$ 30 bilhões, segundo o presidente da ISWA, David Newman. A entidade escolheu o Brasil para sediar o seu Congresso Mundial de Resíduos Sólidos, previsto para setembro de 2014. 

O avanço se deu num ritmo mais lento no Brasil, mas a procura por recursos para projetos de valorização e destinação adequada de resíduos sólidos tem aumentado. "Os números do BNDES são crescentes", afirma Guilherme Martins, gerente do Departamento de Meio Ambiente, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Atualmente, entre operações diretas e indiretas com recursos reembolsáveis, a carteira do banco de fomento para projetos de resíduos sólidos soma mais de R$ 1,7 bilhão em financiamentos. Desse total, 15 operações diretas somam R$ 500 milhões e incluem, por exemplo, projetos de implantação/ampliação de 13 aterros sanitários. Já as operações indiretas automáticas – realizadas por meio de instituições financeiras credenciadas – totalizam R$ 1,2 bilhão. Nesse caso, a maior parte dos recursos é destinada à compra de frotas de caminhões. Além dessas iniciativas, o BNDES destinou R$ 159 milhões em recursos não reembolsáveis a projetos de inclusão sócio-produtiva de catadores de materiais recicláveis e desenvolvimento de tecnologias inovadoras (BNDES Funtec).

Especializada na transformação de resíduos orgânicos em adubo, a brasileira Vide Verde expandiu a capacidade de produção em 40% no ano passado, para fazer frente ao mercado aquecido. Sua primeira unidade foi aberta em 2007, no município fluminense de Resende. Uma segunda planta começou a operar em 2010 , em Magé (RJ). Juntas, as duas processaram cerca de 550 toneladas de resíduos no último mês de novembro. "Ainda é pouco. Só o município do Rio de Janeiro gera nove mil toneladas por dia de lixo doméstico", alerta Marcos Rangel, diretor da empresa. Na avaliação do executivo, a crescente conscientização, aliada à maior fiscalização por parte dos órgãos ambientais, têm contribuído para impulsionar os negócios na área de resíduos sólidos. 

A Vide Verde surgiu em 2007, a partir da experiência de Luiza Campos – mãe de Marcos – numa viagem ao Japão, cinco anos antes. Foi lá que Luiza conheceu a compostagem em escala industrial. Além de ser mais cara que a simples destinação do lixo a um aterro sanitário, a compostagem é mais demorada: são necessários 40 dias para transformar o lixo orgânico em adubo. "Mas no aterro sanitário, o lixo é levado para uma área e fica ali para sempre. A compostagem permite a reciclagem dos resíduos, além de reduzir a emissão de metano", diz Rangel.
Mesmo com a expansão do segmento, a meta de desativar todos os lixões do país ainda este ano enfrenta – entre outros obstáculos – a dificuldade de implantação de aterros sanitários em cidades de menores. "As cidades com menos de 150 mil habitantes possuem um problema gravíssimo para cumprir a lei", destaca Roberto Morale, diretor da Hannover Ambiental, empresa brasileira que desenvolveu uma tecnologia para gerar energia a partir da incineração do lixo. "A maioria dos pequenos municípios possuem apenas lixões. Não têm escalabilidade para atrair investidores para implantar um aterro sanitário, que só possui viabilidade econômica a partir de 200 toneladas por dia."

A Abrelpe estima em R$ 7 bilhões o volume de recursos necessário para dar uma destinação ambientalmente correta (em aterros sanitários) aos 24 milhões de toneladas de lixo domiciliar que são descartados de forma inadequada a cada ano, no Brasil. "Esse total representa R$ 0,09 por dia, por habitante do país, durante um ano", calcula Silva Filho. Na avaliação dele, além da capacitação das prefeituras, é preciso trabalhar também a questão cultural, já que muitos municípios não atentam para os riscos e os impactos negativos gerados pela destinação inadequada do lixo.

Geração de energia a partir de detritos é tendência no mundo

A ampliação da demanda por serviços ambientais, especialmente na área de resíduos sólidos, estimula novos investimentos de empresas que já atuam no mercado. A brasileira Foxx Haztec vai investir cerca de R$ 200 milhões numa unidade de tratamento térmico de resíduos a ser construída em Barueri (SP). A entrada em operação está prevista para o segundo semestre de 2015. A capacidade de geração prevista é de 17 megawatts, a partir do processamento de 825 toneladas por dia de resíduos não aproveitados na coleta seletiva e nem na reciclagem. Tendência mundial, a tecnologia waste-to-energy, presente na futura unidade da Foxx Haztec, permite a recuperação energética de resíduos. 

Segundo a Associação Internacional de Resíduos Sólidos, empreendimentos com esse tipo de tecnologia absorveram US$ 11,3 bilhões em 2013, contra US$ 5,6 bilhões, no ano anterior, e US$ 2,3 bilhões, em 2011. Entre os negócios desenvolvidos pela Foxx Haztec estão seis centrais (aterros sanitários) para tratamento de resíduos não-perigosos – quatro no Rio de Janeiro e mais dois empreendimentos, na Paraíba e em Pernambuco, nos quais a empresa detém participações.O potencial de geração de energia a partir do lixo também atraiu a Hannover Ambiental. Baseada em Brasília, a empresa desenvolveu reatores de plasma para incinerar resíduos sólidos a altas temperaturas, num processo em que o consumo de energia é inferior à geração, gerando um saldo positivo. O excedente de energia pode ser comercializado. 

O equipamento produzido pela Hannover é utilizado numa usina experimental em funcionamento na Universidade de Brasília (UnB), com capacidade para processar diariamente até cinco toneladas de resíduos. A Hannover tem dois contratos de Parcerias Público-Privadas (PPPs) assinados, mas ainda busca financiamento para tirar do papel usinas nos municípios de Mineiros (GO) e Planaltina de Goiás.

Empresa britânica planeja fábrica no Brasil

As oportunidades de negócio relacionadas ao lixo brasileiro vêm atraindo inclusive companhias estrangeiras. Fundada há quatro anos, a SEaB Energy busca um parceiro brasileiro para estabelecer uma joint venture que permita à empresa britânica distribuir no país sua linha de geradores portáteis que transformam alimentos e resíduos orgânicos em energia usando um processo microbiano. O potencial do mercado brasileiro fez com que a empresa estabelecesse a meta de instalar uma fábrica no país ainda neste ano.

"Ao contrário de países ocidentais, o Brasil privilegia uma abordagem descentralizada para a geração de energia. O custo de instalar infraestrutura de transmissão num país do tamanho do Brasil é extremamente proibitivo", analisa Sandra Sassow, CEO da SEaB Energy. "Soluções que oferecem uma fonte sustentável e confiável de energia, tais como nossas micro-usinas, têm enormes oportunidades, particularmente para comunidades remotas que atualmente não têm acesso a uma fonte confiável de calor e energia."

Números

R$23 bi: Foi a movimentação financeira produzida em 2012 por serviços de coleta, destinação e reciclagem de resíduos no Brasil, segundo a Abrelpe.

40%: Era o percentual do lixo domiciliar gerado nopaís que tinha destinação inadequada em 2012.

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