A jabuticaba é nossa

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O Brasil virou saco de pancadas da imprensa internacional. No início, o alvo era apenas a economia, que, de fato, começou a ratear, com inflação em alta e crescimento em baixa. Jornais e revistas especializadas, como “Financial Times” e “The Economist”, passaram a dedicar espaço cada vez maior às nossas dificuldades, chegando a recomendar a troca do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Nas últimas semanas, porém, com a proximidade da Copa do Mundo, o foco das críticas se ampliou. Numa matéria de capa bastante pessimista, a revista alemã “Der Spiegel” advertiu que o país vai pegar fogo em junho, com manifestações de rua e muito quebra-quebra na porta dos estádios. No domingo passado, quem atacou foi “The New York Times” com chamada na primeira página. De olho nas Olimpíadas de 2016, o jornalão americano recomendou aos velejadores que não caiam nas águas poluídas da Baía de Guanabara.

O tiroteio é cerrado e vem de países desenvolvidos e prósperos como Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha. As críticas e os alertas, vale dizer, são pertinentes. E seria ridículo reagir ao noticiário negativo com as patriotadas do conde Afonso Celso, quando escreveu o livro “Por que me ufano do meu País” em 1900. O que espanta no mau humor da mídia estrangeira com o Brasil é a coincidência das reportagens e a concentração do poder de fogo. Neste momento, a Europa, por exemplo, corre grave ameaça com a crise da Ucrânia e os sonhos hegemônicos de Vladimir Putin, o tzar da Rússia pós-comunismo. E a Índia, segunda maior população do mundo, dá adeus ao longo ciclo da dinastia Gandhi-Nehru com a eleição de Narendra Modi, líder do partido nacionalista de oposição Bharatiya Janata (BJP). Mas, pelo visto, os leitores só querem saber das mazelas brasileiras.

Tudo que é demais provoca distorções. E é exatamente isso que está acontecendo. Fala-se do Brasil como se o resto do mundo vivesse dias de abundância. A realidade não é bem essa. Mesmo os países ricos enfrentam problemas. Cresce na Europa a xenofobia e um dos motivos são as altas taxas de desemprego. Quem se mostra espantado com os protestos contra a Copa do Mundo parece esquecer de fatos semelhantes que ocorreram em Londres e Paris, não faz tanto tempo. Nos subúrbios de Paris, jovens de origem africana se rebelaram contra as instituições e adotaram como arma a destruição de automóveis durante a noite. Em Londres, meses antes das Olimpíadas, houve levante nos bairros mais pobres, com a pilhagem de lojas. A jabuticaba é nossa, mas não é exclusividade nossa a rebeldia da juventude. 

Quanto aos preparativos das Olimpíadas de 2016, nós, brasileiros, também estamos preocupados. Há atrasos inexplicáveis e é tempo de corrigir os rumos da organização. Mas os especialistas sabem que não é tarefa fácil despoluir a Baía de Guanabara. Muito menos a curto prazo. A limpeza do rio Tâmisa exigiu o empenho de várias gerações. Ao tempo da rainha Vitória, as sessões do Parlamento tinham que ser interrompidas quando o vento levava o odor do rio para dentro do prédio. A situação só melhorou com investimento pesado em estações de tratamento por décadas. Em Nova York, pouca gente se atreve a tomar banho no rio Hudson, que sofre com os resíduos das indústrias e outros despejos. Até os peixes sofreram mutações para sobreviver. 

O Brasil tem problemas, sim. Mas a má vontade parece excessiva.

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