Com avanço na Austrália, JBS busca expandir vendas à Ásia

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A aquisição pela JBS da australiana Primo Smallgoods por US$ 1,25 bilhão, anunciada na quinta-feira, ilustra bem a estratégia da companhia brasileira a partir da Austrália: expandir as exportações de produtos de maior valor agregado para a Ásia (incluindo China), onde se dá o maior crescimento da população mundial e a demanda por proteínas aumenta de forma acelerada.

Com a aquisição da Primo, que tem seu foco em embutidos e outros processados e faturamento estimado em US$ 1,4 bilhão neste exercício 2015, que começou em julho, a subsidiária da JBS no país diversificará sua atuação, hoje concentrada em bovinos, e verá sua receita chegar a quase US$ 5,2 bilhões. Mas as vendas já eram crescentes, resultado da combinação entre volumes maiores, em razão do incremento da oferta de animais e dos preços dos produtos comercializados, elevados graças à aquecida demanda internacional.

Em que pese o bom momento e as sinergias que poderão ser criadas com a incorporação da Primo, a companhia ainda tem pela frente o desafio de garantir a disponibilidade de bovinos na Austrália, já que mais um período de estiagem no país causa estragos no rebanho.

Antes do anúncio da nova aquisição, ao receber o Valor na sede da subsidiária, em Dinmore – onde se encontra a maior planta de processamento bovinos do Hemisfério Sul -, o diretor John Berry não hesitou em repetir que "o potencial de crescimento aqui continua sendo muito bom, focado em produtos de alta qualidade". Na Austrália, a JBS é administrada por australianos, exceto pela presença de dois brasileiros em postos-chave: Edison Alvares é o CFO (principal executivo financeiro) e José Marinho controla a tesouraria.

Dinmore fica a 30 minutos de carro de Brisbane, capital de Queensland, Estado que concentra quase metade do rebanho australiano de 28,2 milhões de cabeças de gado.

Na unidade da companhia, depois da placa "Welcome to JBS Australia" o visitante logo se depara com anúncios de suas principais marcas, incluindo a Friboi. A brasileira chegou à Austrália, terceiro maior país exportador de carne bovina, com a aquisição da americana Swift, em 2007, por US$ 225 milhões em dinheiro e a assunção de dívidas de US$ 1,2 bilhão. Esse negócio incluiu a australiana AMH, e desde então a JBS fez outras aquisições no país.

Hoje, a JBS é o maior frigorífico da Austrália. Sem contar instalações da Primo – ainda concentradas em abastecer Austrália e Nova Zelândia -, sua capacidade de processamento anual no país é de 1,7 milhão de cabeças de gado bovino (25% da capacidade total instalada na Austrália) e 5 milhões de carneiros (18% do total), dividida em dez unidades.

Se foi considerada necessária para o sucesso de sua diversificação global, a aposta na Austrália também embute um certo risco. O país continua a ter um custo de produção elevado – três vezes maior que no Brasil e duas vezes superior ao americano -, e cerca de 70% dele se refere à compra de animais. Dos 30% restantes, a mão de obra representa 70%. Quem trabalha na linha de produção, no corte de carne, ganha quase US$ 50 mil por ano, um pouco acima do salário mínimo australiano.

Sobretudo em virtude dos gastos com logística e seus reflexos nos preços da matéria-prima, a produção da JBS no país está instalada perto de portos. Diferentemente do que acontece no Brasil, quem arca com o custo do transporte dos animais até o abate é o vendedor.

A diretoria da empresa na Austrália nota que o gado no país é abatido quando está com cerca de 300 quilos, ante 330 nos EUA e 240 no Brasil. Para os australianos, a carne no Brasil é mais magra, e na Austrália a JBS processa animais de raças mais nobres, com peso maior e melhor genética. "Considera-se que a Austrália tem alta qualidade e garante a segurança alimentar. Com isso, conseguimos margens melhores e boa rentabilidade", afirmou Murray Wilson, diretor da planta de Dinmore.

Segundo ele, os produtos da subsidiária têm, em média, 16 semanas de vida de prateleira. A mercadoria costuma demorar seis semanas para chegar ao mercado final, dependendo do destino, e por isso a empresa investiu para alongar prazos de validade. Cada detalhe engorda as margens. Outro exemplo, disse Murray, foi a instalação de um sistema de ventilação refrigerada de alta tecnologia que, além de ampliar a vida útil dos produtos, reduz a encolha (perda de volume) da carne de 4% para 0,5%, aumentando a produtividade.

Os aportes em tecnologia também incluem robótica e computadores sofisticados no processo de produção, o que reduz a exigência de mão de obra. Murray mostrou um robô que, segundo ele, é único no mundo. A máquina em questão corta "rips" (costelas) destinadas à Coreia do Sul. Adiante, outro robô corta os pés dos bovinos. Para os funcionários que permanecem na linha de produção, há até massagistas à disposição – para evitar acidentes e, claro, ampliar a produtividade.

O ajuste nos custos também envolve fornecedores. A Orora, que fabrica embalagens para a JBS na Austrália, tem uma unidade instalada ao lado da planta de Dinmore, com produção voltada apenas para ela. E a Orora só recebe quando a embalagem entra na linha de produção.

Em razão de diferenças geográficas e climáticas, a JBS mantém dois diferentes modelos de negócios na Austrália. No Norte, além de Dinmore (com 810 mil abates por ano), a companhia possui plantas em Rockhampton, Townsville, Beef City and Riverina, além de cinco confinamentos próprios e estratégicos em períodos de escassez de oferta. São processadas diversas raças, entre elas nelore e brahman, para abastecimento de grandes redes de fast food nos Estados Unidos e na Ásia.

O COO (chief operating officer) Anthony Pratt destacou as plantas integradas, que trabalham também com bois confinados, que são alimentados com ração, e têm menos desgaste físico e carne mais macia e de melhor qualidade. "Exportamos carne confinada inclusive para o Brasil", disse Murray. Serão 1,7 mil toneladas este ano, volume quase simbólico – mas valorizado – que inclui picanhas vendidas em restaurantes em São Paulo. Em média, dois dias de produção de determinadas plantas localizada no Norte são só para atender à demanda da Europa.

No Sul, a plataforma de produção é formada por cinco unidades localizadas em Brooklin, Cobram, Devonport, Longford e Bordertown, algumas focadas em bovinos e cordeiros. As carnes mais nobres vão para restaurantes finos e outros clientes especiais em dezenas de países.

Dirigidas pelo COO Sam McConnell, a divisão do Sul exporta 75% da produção total de carne bovina e de carneiro. Ele disse que, com clima mais apropriado, suas operações seguem um programa de qualidade de carnes premium de gado de pasto e sem uso de hormônios.

O "JBS Farm Assurance Programme", implementado em 2011 com a participação de 2 mil produtores, procura garantir que toda a cadeia mantenha as melhores práticas possíveis. Para isso, a JBS paga ao produtor um prêmio de 50 centavos de dólar australiano (1 dólar australiano equivale atualmente a US$ 0,87) por quilo de gado bovino e 20 centavos por quilo de carneiro. Na venda, ganha com isso de 1 a 1,30 dólar australiano por quilo, conforme o corte.

O Japão é o principal mercado da JBS Austrália, com uma fatia de 22% das vendas – a empresa produz 35% de toda a carne que o país da Oceania exporta aos japoneses. Em seguida aparecem EUA (21%), Coreia do Sul (11%) e China (11%). Além de boas perspectivas na China, a subsidiária vê espaço para crescer na União Europeia, Oriente Médio e Indonésia, disse Berry. Também são pujantes as vendas à Grã-Bretanha.

No caso da China, a empresa está de olho no aumento da demanda do país por carne australiana em geral. Pequim importa 1 milhão de toneladas no total, das quais apenas 30% pelos canais formais. Dessa parte legal, a Austrália representa 52%, e grande parte já é produzida pela JBS.

As vendas devem subir com os acordos de livre comércio que a Austrália concluiu com China, Japão e Coreia do Sul. A tarifa de 38% em vigor no Japão, por exemplo, vai diminuir ao longo dos anos. Analistas estimam que os produtores de carne poderão ganhar US$ 11 bilhões na China quando as alíquotas forem eliminadas, dentro de nove anos.

Neste ano, o faturamento da JBS Austrália cresceu 10%, mas Anthony Pratt disse que esse ritmo não é sustentável e previa alta de 5% em 2015, antes da Primo. Em 2014, a oferta de animais foi boa por causa dos abates gerados pela seca, o que não deverá se repetir. Mas, com a Primo, líder em presuntos, bacon e embutidos como linguiça e salame, a JBS passa a ter maior acesso ao mercado australiano de suínos, assume a liderança em embutidos também na Nova Zelândia e reforça suas exportações de produtos de maior valor agregado.

De quebra, dilui a dependência da oferta de animais na Austrália, onde os pecuaristas sempre têm a opção, influenciada pelo clima, de vender gado para abate ou exportar o animal vivo. Muitos animais são vendidos para Rússia, China e Oriente Médio, o que colabora para encolher a oferta australiana disponível.

Fonte:  Valor Econômico

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