Empregador é responsável por danos ao ambiente de trabalho e à saúde

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No Brasil, até 1988, o enfoque principal sobre o meio ambiente do trabalho e a saúde do trabalhador era monetarista. Quase tudo girava em torno do pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade e de algumas indenizações de Direito comum, quando o trabalhador se acidentava.

Todavia, a Constituição Federal de 1988 foi considerada como um divisor de águas, estabelecendo:

Artigo 7º — “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(…)

XXII – “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”.

(…)

XXVIII – “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”.

Das disposições constitucionais acima decorrem dois sistemas de proteção à saúde do trabalhador. Primeiro e com prioridade, a prevenção dos riscos no meio ambiente do trabalho, para preservar a saúde do trabalhador, que é um direito humano fundamental. Depois, se essa prevenção não ocorrer ou não atingir os seus desejados efeitos, existe o sistema reparatório, que deve ser usado com a finalidade de compensar a vítima e punir exemplarmente o agente do dano, para que a lição sirva como incentivo ao cumprimento das normas legais sobre segurança, higiene e medicina do trabalho na busca do respeito aos direitos da pessoa humana nos ambientes de trabalho. Quer dizer, a responsabilidade civil passa a ter função reparatória e preventiva.

Para aplicar o sistema da responsabilidade civil é necessário o cumprimento dos seguintes pressupostos clássicos: ação ou omissão; dano efetivo; culpa do agente; e nexo de causalidade.

Alguns desses pressupostos, dependendo da situação analisada, não serão exigidos. É o caso da culpa, que não se examina quando a responsabilidade é objetiva.

O enfoque nestas poucas linhas é levantar algumas reflexões sobre a responsabilidade civil objetiva e subjetiva no tocante aos danos ao meio ambiente do trabalho e à saúde do trabalhador, diante do tratamento diferenciado dado pela CF ao tema.

Responsabilidade civil por danos ao meio ambiente do trabalho

A Lei 6.938/81 — Lei da Política Nacional do Meio Ambiente — estabelece no artigo 14, parágrafo 1º, que: “Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.

Essa lei foi pioneira sobre o tema, como se vê, criando a responsabilidade civil objetiva para os danos ao meio ambiente e também para os terceiros afetados, numa coerência lógica, pois se para o dano ao meio ambiente a responsabilidade é objetiva, não teria sentido se perquirir da culpa em relação às consequências para as pessoas prejudicadas por esse dano, porque em primeiro lugar, no centro das atenções, está a proteção da pessoa humana e da sua dignidade (Constituição Federal, artigos 1º e 170).

A Constituição de 1988 realmente avançou sobre a proteção ambiental, dizendo no artigo 225 que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, preocupando-se com os danos concretos, efetivos, abstratos e futuros.

Quanto ao sistema de responsabilidade civil ambiental, o parágrafo 3º do artigo 225 marcou a sua objetividade, estabelecendo que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

A responsabilidade civil ambiental é, pois, objetiva e se baseia na teoria do risco integral, pela qual o agente responde pelos danos decorrentes da sua atividade, independentemente de ser ela lícita ou ilícita, autorizada ou não pelos Poderes Públicos. Ou seja, quem causar dano ao meio ambiente responde, sempre, objetivamente, porque o bem protegido é a vida ou a sadia qualidade de vida (Constituição Federal, artigo 225 e Lei 6.938/81, artigo 3º), como reconhecem com tranquilidade a doutrina e a jurisprudência.

Responsabilidade civil por danos à saúde do trabalhador

Se para os danos causados ao meio ambiente, nele incluído o do trabalho (Constituição Federal, artigo 200, inciso VII), a responsabilidade civil é objetiva, diferentemente ocorre em relação aos danos à saúde do trabalhador, imperando ainda neste particular a responsabilidade subjetiva, baseada na culpa do agente, o que vem desde as suas origens no nosso direito.

Foi o Decreto 7.036/1944 (artigo 31) que inaugurou a responsabilidade civil do empregador nos acidentes de trabalho, mas somente para o caso de dolo. A jurisprudência, marchando adiante dos códigos legais, levou à edição, pelo STF, em 1963, da Súmula 229, com o seguinte teor: “A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso de dolo ou culpa grave do empregador”.

A Constituição de 1988, evoluindo sobre o tema, reconheceu no artigo 7º que:

“São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(…)

XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”.

Pelo inciso XXVIII do artigo 7º, a responsabilidade do patrão nos acidentes de trabalho existe em qualquer situação de culpa, mesmo a mais leve (negligência, imperícia e imprudência), embora continue, em regra, subjetiva, como reconhece a jurisprudência dominante (Processo 01748-2007-482-02-00-7, no TRT-2).

Mas essa regra comporta exceções, como vêm reconhecendo a doutrina e também a jurisprudência. A base dessa flexibilização está nos fundamentos modernos da responsabilidade civil, que são a proteção da vítima (e não mais do causador do dano, como nos tempos passados), a proteção da dignidade humana (Constituição Federal, artigo 1º), a valorização do trabalho (Constituição Federal, artigo 170) e a sua finalidade exemplar, pedagógica, punitiva e preventiva.

Nessa nova ótica, visando à melhoria da condição social do trabalhador, à responsabilidade civil decorrente de acidente do trabalho, quanto ao fundamento, aplicam-se, além do inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição (responsabilidade subjetiva):

a) para os agravos decorrentes de danos ambientais, o parágrafo 3º do artigo 225 da Constituição e o parágrafo 1º do artigo 14 da Lei 6.938/81 (responsabilidade objetiva), conforme Enunciado 38 da I Jornada de Direito do Trabalho;

b) para as atividades de risco, o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil (responsabilidade objetiva), conforme processo no TST – RR – 422/2004-011-05-00;

c) para os acidentes dos servidores públicos, o parágrafo 6º do artigo 37 da CF, (responsabilidade objetiva), conforme Apelação Cível 124.761.200; 2ª Câmara Cível, relator juiz Pilde Pugliese, DJ-PR de 27 de novembro de 1998 e Enunciado 40 da I Jornada de Direito do Trabalho;

d) para os acidentes nas empresas privadas prestadoras de serviço público, o parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição, (responsabilidade objetiva), conforme processo STF-RE 591.874;

e) para os acidentes em transporte fornecido pelo empregador, os artigos 734, 735 e 736 do Código Civil (responsabilidade objetiva), conforme processo no TST – RR – 9/2006-102-18-00; 15 de maio de 2009;

e) para os acidentes nas terceirizações, os artigos 932-III, 933 e 942, parágrafo único do Código Civil, (responsabilidade objetiva e solidária), conforme processo no TRT-3 0365-2005-068-03-00-5 RO e Enunciado 44 da I Jornada de Direito do Trabalho, entre outros casos interessantes, como vem reconhecendo a jurisprudência.

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