Aos 17 anos, muitos estão prestes a concluir os estudos e se preparando para entrar no mercado de trabalho. No futebol, o menino que vive a rotina de categorias de base tenta dar os primeiros passos no profissional. Para Fellipe Bastos, no entanto, essa idade foi o momento para tomar a decisão mais importante até então: deixar o Brasil para morar na Europa e iniciar a carreira em Portugal, no Benfica. E começou ali uma vida de antecipações. Cedo demais para o Velho Continente, cedo demais para voltar – três anos depois – e também antes do esperado veio a oscilação da carreira.
Após um início bom no Vasco, viu o volume das vaias crescerem, a pressão aumentar e, como dita o ritmo de sua vida, sofreu sem estar pronto. O rendimento caiu, vieram empréstimos para Ponte Preta e depois para o Grêmio, envolvido na negociação que levou Kleber Gladiador ao Rio de Janeiro. E só agora a recuperação ocorre.
"Eu acho que no início [no Vasco] eu rendia o que rendo hoje. Mas era um pouco perseguido pela torcida. Muitas coisas que eu fazia, que faço aqui, não tinha tanta confiança dos torcedores. Os treinadores sempre me botavam, Cristóvão [Borges], Ricardo [Gomes] e PC [Gusmão], que me deu a primeira oportunidade, sempre me passavam confiança. Mas eu não tinha isso de todos, do torcedor. Era um pouquinho de perseguição comigo", disse.
Longe de tanta pressão, Fellipe encontrou o lugar ideal para dar um novo passo que, em uma carreira regular, ocorreria apenas mais tarde: a reconstrução. E, no Grêmio, em poucos meses, tem mostrado que é possível. Encontrou a confiança necessária. E para seguir assim, o desejo óbvio foi revelado em entrevista ao UOL Esporte: manter-se no clube e, se possível, marcar esa história com títulos.
Leia a entrevista completa:
UOL Esporte: A sua carreira começa fora do Brasil. Como foi chegar à Europa antes mesmo de jogar no Brasil?
Fellipe Bastos: Foi uma negociação, eu tinha 17 anos, fui para o PSV, não tinha contrato com ninguém após a base no Botafogo. Na época meu empresário teve negociação com o PSV, mas não fechou contrato. Cheguei a ir à Holanda, realizar alguns treinamentos, mas não fechei contrato. Voltei para o Brasil, e o Benfica fez a proposta. Fomos até Portugal, fechamos. Eu troquei uma base do Botafogo, que não era tão boa de estrutura, por um clube da dimensão do Benfica, de uma grandeza na Europa, com jogadores que faziam história no mundo todo. Aimar, Di Maria, Luizão, Rui Costa, jogadores que eu jogava no vídeo-game e passei a jogar junto. Foi uma transformação muito grande. Aprendi muito com eles e observava muito o que eles faziam para que eu pudesse imitar. Sou muito disso, não só de imitar, mas de aprender com jogadores de qualidade. Ver, jogar e aprender foi muito importante. Se eu pensasse com minha cabeça de hoje, eu seguraria um pouco esta saída [para Europa] para não bater e voltar, sairia com uma cabeça mais madura.
UOL Esporte: Você acha que ainda pode voltar à Europa?
Fellipe Bastos: É um desejo meu, eu quero voltar. Mas é um desejo meu também seguir no Grêmio, marcar história, ser campeão, para depois pensar em Europa, em grandes centros, grandes competições. É um desejo que tenho, mas primeiramente passa por me firmar e marcar história aqui.
UOL Esporte: Tinha algum jogador mais próximo no Benfica, entre estes citados?
Fellipe Bastos: O Luizão sempre foi um pai para mim, sempre me orientou muito. David Luiz me ajudou muito também. O Di María também ficava conosco. Eu, David e Di María. Mas o David e o Luizão mais, me deram muitos conselhos que levo até hoje na minha vida.
UOL Esporte: A sua carreira segue até o Vasco, primeiro por empréstimo, e depois em uma contratação definitiva. Por que você acha que no Rio de Janeiro não conseguiu render o mesmo que rende hoje no Grêmio? Você concorda que não foi tão bem?
Fellipe Bastos: Eu acho que no início eu rendia o que rendo hoje. Mas era um pouco perseguido pela torcida. Muitas coisas que eu fazia, que faço aqui, não tinha tanta confiança dos torcedores. Os treinadores sempre me botavam, Cristóvão [Borges], Ricardo [Gomes] e PC [Gusmão], que me deu a primeira oportunidade, sempre me passavam confiança. Mas eu não tinha isso de todos, do torcedor. Era um pouquinho de perseguição comigo. Por aquilo que fazia dentro de campo. Acabavam, na época, Juninho [Pernambucano] e Felipe não podendo jogar juntos. E na época o torcedor ficou um pouco machucado. Quem entrava no lugar de um ou de outro era eu. A torcida não entendia isso como um bem para o time. Não que Juninho e Felipe, como grandes ídolos que são, não pudessem jogar juntos, mas no momento quem entrava era eu. E o torcedor não entendia muito isso. Não gostavam da minha atuação, do que eu fazia, já me vaiavam e perseguiam. Mas sou muito grato ao Vasco, a chance que me deram de aparecer no futebol brasileiro, também às pessoas que me compraram do Benfica e confiaram em mim. Não tenho mágoa, só carinhos do Vasco. Não fecho minhas portas para eles, porque eu sei que muitos torcedores têm carinho por mim. Sei que isso pode mudar, mas não tenho mágoa dos torcedores do Vasco também.
UOL Esporte: Seu objetivo é ficar no Grêmio após o empréstimo?
Fellipe Batos: É o que eu quero. Aqui no Grêmio tenho atuações que há muito tempo não vinha tendo, além da confiança de todos. Um jogador com confiança faz coisas que geralmente não faz. É isso que tenho feito aqui. Eu quero ficar, é meu desejo. E tomara que se torne realidade no fim do ano. Que eu possa ficar muito tempo, conquistar títulos e fazer história aqui.
UOL Esporte: Você sabe que o Felipão, em momentos de sucesso, sempre teve um volante de destaque no time. Dinho, no Grêmio, Galeano, no Palmeiras, Gilberto Silva e Kleberson na seleção… Como você tem se destacado no Grêmio, joga nesta posição, acha que isso pode se repetir?
Fellipe Bastos: Todos conquistaram alguma coisa com Felipão. Libertadores com Dinho e Galeano. Gilberto Silva e Kleberson o título mundial. Então para eu ser este volante da 'era Felipão', temos que conquistar [títulos]. Dentro dos jogos, mostrar que posso ser o diferencial no time. E isso tenho tentado mostrar. Venho me dedicando para continuar recebendo as oportunidades para um dia ser lembrado como esses grandes jogadores.
UOL Esporte: Mesmo há pouco no Grêmio, a torcida gosta bastante do seu futebol. Você acha que essa identificação com as características do futebol gaúcho podem ter ajudado nisso?
Fellipe Bastos: Eu sempre falava com meu pai, que é um cara que eu sempre converso, que o estilo que se joga aqui é o meu estilo de jogo. Eu sempre quis vir para cá jogar em um grande clube. Hoje jogo em um grande clube, faço parte de um Grêmio que está se reconstruindo, se reformando, buscando coisas dentro do Brasileiro. Para frente, se vê também um Grêmio que pode conquistar títulos e marcar história. E que eu possa marcar história também dentro de um Grêmio vencedor. Penso neste futuro. É uma coisa que me faz mais feliz, com mais esperança e vontade de trabalhar. Para os torcedores lá na frente verem um Felipe Bastos vencedor.
UOL Esporte: Você acha que se enquadra nesta reconstrução também. Do Grêmio, do Felipão depois da Copa do Mundo, mas também sua pessoalmente…
Fellipe Bastos: Com certeza. Estou me reconstruindo como pessoa e como jogador. No Vasco eu era uma pessoa totalmente diferente. Dentro de campo dá para ver isso. Mudei alguns hábitos que eu tinha no Rio de Janeiro, sou um cara muito mais ligado profissionalmente, nos meus scouts, o que eu faço nos jogos, para melhorar o ruim e seguir fazendo o bom. A experiência vai me dando esta maturidade, esta coisa que o jogador tem de ter. E está me dando cedo, aos 24 anos. Estou aprendendo e crescendo junto com outras pessoas que estão se reconstruindo. No Grêmio, hoje, eu agradeço muito ao Rui [Costa, diretor executivo de futebol] pela oportunidade que me deu de me reconstruir como pessoa e como jogador. Isso tem me empolgado para marcar história e ser lembrado pelo torcedor com conquistas.
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